[os que seguem]

domingo, 20 de dezembro de 2009

A casa parecia a imensidão de seu coração [Cap. III] - Fragmentos

Capítulo III

Fragmentos

Impregnado por seu desejo, caminha, ele, para um banho de regeneração. A água cai em sua cabeça, fria, tal qual águas que banham os lugares árticos. É desperto. Lucidez. Palidez. Olha-se atentamente no espelho do banheiro, impoluto impecável banheiro, pois o pobre, de transtornos, sofria. “Quem penso que sou?” – a pergunta ecoa por toda a gigante extensão do vazio e cheio que é sua mente. Não há resposta satisfazível.

Mais uma vez veste-se com sua calça jeans e suas camisas brancas de algodão! Quer, agora, desbravar sua vizinhança. “Onde estará?” – lembra-se que não é sabido o lugar de repouso de seu MP4. Não o poderia fazer sem seu aparelho cúmplice da fuga. Ajudava-o a abstrair toda a bizarrice dos humanos donos de si. Sua antipatia e egocentrismo afastavam-o de fato de qualquer evolução de Homo Erectus que se mostrasse prestativa.

Caminha, ele, na rua, por Outono, coberta de folhas de plátanos. Dia, como habitual, frio e molhado, o que, para ele, era, sem dúvida, dos melhores dias do ano. Sua figura vagava lentamente por toda a calçada, com passos tímidos e sem pressa de chegar, indo de encontro ao seu refúgio de todo o erro do planeta: o fim do bairro.

O fim do bairro mais parecia um abismo sem fim. Crianças desvairadas arriscavam-se em brincar por perto de tal precipício. Dia sombrio, aquele, em que o pequeno da casa ao lado caiu, num deslize infame, morro abaixo. Dia dos piores dias da vida do povo da casa ao lado. Mas, o fim do bairro não é de todo mau. Casais teimam em constranger os anciãos com suspiros e gemidos atrevidos. Mas, para ele, nada disso importava. Aquele era o lugar do pôr-do-sol mais belo que olhos terráqueos poderiam um dia deslumbrar. Por minutos, via seu íntimo aquietar-se. Sentia, nem que por instantes, paz.

Paz que, em meio ao caldeirão de perguntas, fazia-se por meros segundos. Mas era liberto naqueles poucos segundos. Daí tal gozo em prostrar-se na árvore mais ao alto do fim do bairro para ouvir suas músicas ou, ouvir seus pensamentos.

Na volta, pela rua, percebia-se os olhares de toda a gente a julgar figura mais intrigante. Não fazia perceber-se. Mas era ineficaz. Era perceptível até para o mais negligente. E era sabido por ele. Mas sua arrogância vencia qualquer crítica que lhe faziam por olhares, afinal, sabia ele, que todos, por mais desinformado que fosse, sabiam o que houvera passado. Não era um segredo e sim, um outdoor.

Nenhum comentário:

Postar um comentário